quarta-feira, 27 de março de 2013


«DAR RAZÃO DA NOSSA ESPERANÇA»


A Páscoa é a grande festa dos cristãos, o centro do ano litúrgico. É que a Ressurreição de Jesus é o fundamento da fé cristã. Se Cristo não ressuscitou é vã a nossa fé – adverte S. Paulo (1 Cor 15, 17). Ressuscitando, Jesus afiança a Sua mensagem libertadora e a promessa de salvação. Que é uma realidade, não apenas esperada, mas já presente.
Por isso mesmo, a Ressurreição de Jesus, celebrada na Páscoa, é fonte e sólido fundamento da esperança cristã. Conforme a definição da Carta aos Hebreus, a fé cristã é esperança, no sentido de constituir a garantia do que se espera e a certeza do que não se vê (cf. Heb 11, 1).

Com efeito, a fé não é uma convicção meramente subjectiva. Como muito bem explicava Bento XVI, a fé «dá-nos já agora algo da realidade esperada… Ela atrai o futuro para dentro do presente (…). Sendo assim, poderemos agora dizer: o cristianismo não era apenas uma «boa nova», ou seja, uma comunicação de conteúdos até então ignorados. Em linguagem actual, dir-se-ia: a mensagem cristã não era só “informativa”, mas “performativa”. Significa isto que o Evangelho não é apenas uma comunicação de realidades que se podem saber, mas uma comunicação que gera factos e muda a vida»  (Bento XVI, Spe Salvi, 2007, nº 7 e 2).

Por isso, quando S. Pedro exorta os cristãos a darem razão da esperança que os anima (cf. 1 Ped., 3-15), está a referir-se a uma vivência de fé tal, que seja capaz de se explicar, sobretudo com o testemunho de vida. De facto, nós já fomos salvos – afirma S. Paulo - mas em esperança. Quando se vê aquilo que se espera, então já não é esperança, pois como é que alguém espera aquilo que já está a ver? Mas, se esperamos aquilo que ainda não vemos, esperamo-lo com paciência (Rm 8, 24).

O que não significa resignação passiva. A esperança cristã é activa. Implica compromisso, realizado com confiança, perseverança e constância, isto é, «paciência» (em linguagem bíblica). Que é também «paixão», no sentido de dedicação total e de empenho sofrido. É o que S. Paulo exprime, quando afirma: Bem sabemos que até agora o mundo todo geme e sofre, como se fossem dores de parto. Não é só universo, mas também nós, que já começámos a receber os dons do Espírito. Nós sofremos e esperamos… a nossa total libertação. (Rm 8, 22-23).

A liturgia da Igreja diz-nos que Jesus, «morrendo destruiu a morte e ressuscitando restaurou a vida». Efectivamente, em Cristo Ressuscitado já vencemos tudo o que oprime o ser humano. A Ressurreição de Jesus, presente e actuante na história, faz novas todas as coisas. Como explica S. Paulo, pelo Baptismo fomos sepultados com Ele na Sua morte, para com Ele ressuscitarmos para uma vida nova (cf. Rm, 6, 3).

Neste mundo em crise, nós cristãos temos de mostrar, com a nossa vida e o nosso empenho, em todos os domínios da vida, que é possível algo de diferente e melhor.  Os tempos de crise são, por definição, momentos de mudança. Ora, a vida cristã é uma caminhada permanente de conversão e, portanto, de mudança, na maneira de ser e de agir.

  • Assim, nesta perspectiva da fé pascal, nós cristãos deveríamos estar motivados e mobilizados para as mudanças necessárias, na sociedade em que vivemos e também na Igreja, a que pertencemos. Estamos realmente numa “mudança de época”: saindo de um modelo, inadequado à situação actual e entrando noutro, ainda não bem definido. Isso é desconfortável. Exige roturas, também dolorosas, dentro e fora da Igreja.
  •  Podem e devem discutir-se os conteúdos e os métodos das reformas. Mas elas são um imperativo inadiável. Devem encontrar eco no cristão esclarecido e comprometido, que quer ser também um cidadão responsável.
  • Pouco adianta lamentar-se ou simplesmente protestar. Importa inserir-se no debate, dando o contributo positivo da visão cristã da vida e da história. Comprometendo-se com a mudança. Qual fermento, que leveda a massa.
  • Todas as realizações humanas, porque limitadas e condicionadas circunstancialmente, são relativas e efémeras. A realidade última e definitiva é a Páscoa de Jesus, que já marcou o destino da humanidade, abrindo caminho ao Reino de Deus. Sempre em construção, mas já presente no meio de nós.
  • Por isso mesmo, os cristãos deveriam ser homens e mulheres do futuro, abertos às mudanças, que se impõem na sociedade e na Igreja. Porque acreditam na força transformadora da Ressurreição de Cristo, comprometem-se, aqui e agora, para ajudar a construir o «Império do Espírito Santo», que torna possível a fraternidade universal. Por isso, não desistem perante as inevitáveis dificuldades. Encaram a vida com confiança e o futuro com esperança.


Faz, pois, todo o sentido trocarmos uns com os outros votos de Feliz Páscoa, na alegria e esperança de Cristo Ressuscitado.


+ António, Bispo de Angra

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